Durante milhares de anos, utilizaram-se substâncias para tentar melhorar o rendimento desportivo, independentemente, se eram nocivas ou não para a saúde.
O único objetivo em mente era vencer, a qualquer custo.
A meados dos anos 30, a Associação Internacional de Federações de Atletismo (IAFF), foi a primeira entidade que proibiu o uso de certas substâncias cujo o objetivo era melhorar o rendimento desportivo, ou seja, o Doping. E assim, iniciou-se uma questão de Ética Desportiva. Foi apenas nos anos 70 é que surgiu a tecnologia que permitia detetar estas substâncias nos atletas.
São inúmeras as substâncias que foram utilizadas para, artificialmente, melhorar o rendimento e aumentar a massa muscular.
O que são os EAA?
Os Esteroides Androgénicos Anabolizantes (EAA), são hormonas representadas pela testosterona (principal hormona masculina) e é sobre estes compostos que vamos falar neste artigo.
Tal como referimos, os EAA são hormonas que compreendem a testosterona e seus derivados.
São produzidos nas gónadas (testículos e ovários, produzidos em quantidades bem diferentes) e na zona cortical das glândulas suprarrenais.
Medicamente, os EAA são utilizados como uma terapia específica no tratamento de doenças androgénicas (por exemplo, atraso na puberdade) e também em algumas situações de sarcopenia (é a perda de massa muscular, um acontecimento comum após os 50 anos de idade).
Erradamente, podem ser consumidos para o aumento da massa muscular, diminuição do cansaço e diminuição da gordura corporal. Infelizmente, a sua utilização abusiva tem vindo a crescer, ao contrário da educação e informação que previne o seu consumo.
Desde há cerca de 40 a 50 anos que os EAA têm vindo a ser usados como doping em diversas áreas do Desporto de alta competição, sempre com o objetivo de aumentar a performance desportiva.
Recentemente, estudos revelaram que devido à pressão da sociedade, os padrões culturais de beleza, levaram a que estas substâncias sejam consumidas em “desportistas amadores”, em que o objetivo principal deixou de ser aumentar a performance, mas sim, melhorar a sua imagem corporal de uma forma mais rápida. (1)
Existe ainda outra razão que levou ao seu consumo excessivo, a Dismorfia Muscular que é uma doença psicológica em que o indivíduo nunca se sente satisfeito com o seu corpo, é uma doença semelhante à Anorexia.
A opinião dos Médicos
Muitos médicos referem que ainda existe um enorme desconhecimento das reais e graves consequências para a saúde sobre o consumo dos Esteroides Androgénicos Anabolizantes (EAA), as quais, por vezes, são irreversíveis.
O Uso não médico de EAA é um Grave problema generalizado de Saúde Pública
Em Portugal, realizou-se um estudo no Porto, 63,6% dos atletas já tinha consumido algum tipo de substância dopante, sendo que 11,6% eram consumidores regulares de EAA. (2)
Estas substâncias são manipuladas de forma a potenciarem os efeitos anabólicos e levar a um rápido crescimento muscular.
Os efeitos anabólicos atingem-se com doses 10 a 100 vezes a fisiológica, acarretando riscos para a saúde do atleta. (3)
A utilização de EAA pode levar a casos severos e potencialmente fatais, desde a Hepatite aguda, Enfarte do Miocárdio, maior possibilidade de Sépsis (acontece quando as bactérias causadoras de uma infeção provocam uma resposta exagerada do nosso organismo), entre outros.
Para este artigo, achamos relevante mencionar alguns efeitos secundários provocados pelo o uso de EAA:(3)
Nos homens, pode originar infertilidade, aparecimento de mama, disfunção erétil e diminuição da libido
Nas mulheres, pode originar alteração da voz (irreversível), aparecimento de pelo, atrofia da mama, irregularidades menstruais e calvices (irreversível).
Problemas Cardiovasculares (hipertrofia ventricular, disfunção cardíaca)
Problemas Músculo-esqueléticos (tendinites, roturas tendinosas)
Problemas Psiquiátricos (agressividades, delírio, psicose)
Problemas Dermatológicos (Acne, Alopecia, Hirsutismo)
Cessação dos EAA: Efeitos
A cessão do consumo dos EAA não é um processo fácil, segundo uma análise, cerca de 30% dos consumidores de EAA apresentam sinais de dependência (semelhante a drogas). (6)
Após a paragem do consumo de EAA, o organismo pode levar semanas, meses ou anos a recuperar a totalidade, podendo nunca vir a recuperar.
Vários fármacos foram testados para acelerar este processo de recuperação, no entanto, nenhum deles demonstrou verdadeiros benefícios, podendo ainda, trazer alguns riscos acrescidos. (7)
Conclusão
É importante salientar que existe a responsabilidade de todos os profissionais de saúde e da prática de exercício físico sobre a formação dos nossos jovens, atletas federados ou não.
É fundamental suscitar o prazer pelo desporto, pelo bem-estar físico e psíquico, e transmitir que o consumo de EAA, além de ser prejudicial para a saúde, é “batota”, pelo que os princípios e os valores do Desporto são violados. É, pois, uma questão de Ética.
Bibliografia
- Sagoe D The global epidemiology of anabolic-androgenic steroid use: a meta-analysis and meta-regression analysis. Ann Epidemiol 2014 May;24(5):383-98. doi: 10.1016/j.annepidem.2014.01.009. Epub 2014 Jan 30.
- Massada M, Consumo de substâncias dopantes no desporto recreativo português – um estudo em praticantes de musculação; Rev Medicina Desportiva.
- Madalena Rochaa Fátima Aguiara Helena Ramos (2014) O uso de esteroides androgénicos anabolizantes e outros suplementos ergogénicos – uma epidemia silenciosaAnabolic sndrogenic steroids and other performance‐enhancing drugs abuse ‐ a silent epidemic
- Harrison G Pope Jr 1, Ruth I Wood, Alan Rogol, Fred Nyberg, Larry Bowers, Shalender Bhasin Adverse health consequences of performance-enhancing drugs: an Endocrine Society scientific statement. 2014 Jun;35(3):341-75. doi: 10.1210/er.2013-1058. Epub 2013 Dec 17.
- Andrew B Parkinson 1, Nick A Evans Anabolic androgenic steroids: a survey of 500 users. 2006 Apr;38(4):644-51. doi: 10.1249/01.mss.0000210194.56834.5d.
- Kanayama G.a,b · Hudson J.I.a,b · Pope, Jr. H.G.a,b. Anabolic-Androgenic Steroid Use and Body Image in Men: A Growing Concern for Clinicians. Psychother Psychosom 2020;89:65–73. https://doi.org/10.1159/000505978
- Cyrus D Rahnema 1, Larry I Lipshultz 2, Lindsey E Crosnoe 1, Jason R Kovac 2, Edward D Kim 3. Anabolic steroid-induced hypogonadism: diagnosis and treatment. 2014 May;101(5):1271-9. doi: 10.1016/j.fertnstert.2014.02.002.